Você decidiu comprar um imóvel na planta, está pagando as prestações, mas perde o emprego e não vai mais ter condições de continuar com a compra. Ou pretendia fazer um financiamento, que foi negado pelo banco. Esses cenários não são incomuns, e os consumidores têm o direito de desistir da compra do imóvel nessas situações. Quando a desistência ocorre antes da entrega das chaves ocorre o chamado distrato.
Não há atualmente uma lei que regulamente o direito de distrado. Sua defesa tem como base o código de defesa do consumidor e as sucessivas decisões da Justiça nesse sentido. Os juízes têm entendido que cabe uma multa de entre 10% a 15% do valor pago à construtora até o momento do rompimento do negócio. O governo do presidente Michel Temer já anunciou que pretende regulamentar a questão. Porém, até agora, apesar de terem sido feitas reuniões, nada foi decidido.
Veja o que fazer se você está nessa situação e quais são os seus direitos:
O consumidor pode pedir o distrato do imóvel até a entrega das chaves.
Em primeiro lugar, a construtora ou incorporadora, para manifestar seu interesse em desfazer a venda. Para fazer o distrato, o consumidor deve fazer uma solicitação por escrito, dizendo que tem interesse em desistir do negócio, e protocolar esse documento junto à construtora, solicitando um prazo para que ela se manifeste, diz Renata Reis, coordenadora do Procon-SP.
Nesse momento, é possível negociar um acordo. “Nessa tentativa, porém, muitas vezes as empresas dizem que não podem fazer o distrato e que o compromisso de compra e venda é irretratável”, diz Marcelo Tapai. Nesse caso, o consumidor deve procurar um advogado ou órgão de defesa do consumidor.
A lei não determina o porcentual que o consumidor irá receber de volta quando pede o distrato. Mas, em decisões judiciais, os consumidores têm conseguido garantir entre 85% e 90% dos valores pagos até o momento da desistência da compra, corrigidos pela inflação e em parcela única.
Porém, se o motivo do distrato for o não cumprimento do contrato por parte da construtora, o consumidor tem o direito de recuperar tudo o que já pagou. “Quando um consumidor tem um imóvel na planta e a empresa não cumpre com alguma obrigação, ele terá direito à devolução integral dos valores que pagou”, afirma Renata Reis.
Atraso na entrega do imóvel, por exemplo, é um dos casos em que o consumidor pode reaver todo o valor pago. Tapai afirma que as empresas têm adotado, nos contratos, uma previsão de seis meses de tolerância em relação à data inicial prevista para a entrega, para se precaver. A manobra tem sido aceita pela Justiça. Se o atraso for maior, contudo, é possível pedir a restituição de todos os valores pagos, diz o advogado.
Outro exemplo de não cumprimento de uma obrigação seria a negativa de financiamento ao consumidor. Vamos supor que você vá até o estande da empresa e decida comprar um apartamento na planta. Neste momento, muitas vezes, a própria construtora informa as condições que o banco impõe para o financiamento, e promete ao consumidor que ele atende àquelas condições e é elegível a um financiamento imobiliário. No entanto, na hora em que o consumidor vai de fato pedir o empréstimo a uma instituição financeira, esta o nega. Neste caso, a Justiça também tem garantido a retistuição integral dos valores pagos.
Se o consumidor pedir o distrato e a construtora se oferecer para devolver metade do dinheiro, o melhor a fazer é não aceitar o acordo e procurar assessoria. “É comum a empresa tentar fazer acordos, especialmente com um cliente que esteja precisando de dinheiro”, diz Tapai. “Se o consumidor já pagou R$ 100 mil, e a empresa oferece apenas R$ 20 mil, a recomendação é não receber esse dinheiro, não assinar nada e procurar um advogado”.
A devolução dos valores pagos pelo consumidor deve ser imediata — considerado o prazo bancário para fazer a transferência, diz Renata. “Não há razão para que a empresa retenha os valores ou os devolva na mesma quantidade de parcelas que o consumidor pagou".
O ideal é procurar a construtora antes de ficar inadimplente. Estando inadimplente, o consumidor ainda tem o direito de pedir o distrato, mas a situação é um pouco mais complicada. “A inadimplência permite que a empresa cancele o contrato e ainda cobre juros, multa e correção monetária sobre os valores ainda não pagos e já vencidos”, diz Renata. Ou seja, o consumidor pode ser obrigado a pagar as parcelas vencidas com multa, além de não conseguir de volta de 10% a 15% do montante já pago.
Sim, normalmente os contratos de compra de imóveis na planta determinam um porcentual de multa em caso de desistência. No entanto, “a cláusula pode ser considerada abusiva em algumas circunstâncias”, diz Renata. Isso acontece se a multa estipulada é superior aos 10% a 15% do valor pago pelo consumidor até o momento do distrato, valor que a Justiça tem entendido como razoável. Neste caso, o consumidor pode entrar com um processo contra a incorporadora, questionando a cobrança.